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Da inconstitucional e ilegal inclusão de verbas indenizatórias na base de cálculo das contribuições

A competência tributária para a instituição e cobrança das contribuições para financiamento da seguridade social sobre a folha de salários e demais rendimentos está prevista e delimitada no art. 195, I, alínea a, da Constituição Federal.

Por sua vez, a cobrança das contribuições devidas a terceiros está prevista no art. 240 da CF, que recepcionou a legislação anterior e manteve o respaldo constitucional para a cobrança.

A simples leitura dos dispositivos acima citados é o suficiente para verificar que a própria Constituição Federal definiu como objeto da possível incidência tributária a “folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”.

Ainda assim, considerando a rígida divisão de competência tributária e o nítido contorno da norma-padrão de incidência fixada no texto constitucional, o legislador ordinário, por meio da Lei nº 8.212/91, instituiu a cobrança da contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salários, É preciso destacar, ainda, que o artigo 28, §9º da Lei 8.212/91, elenca as parcelas que não integram o salário contribuição, as quais podemos resumir em a) benefícios previdenciários, b) verbas indenizatórias e demais ressarcimentos c) outras verbas de natureza não salarial.

Por sua vez, as leis que instituem a cobrança das contribuições sociais destinadas a terceiros (INCRA, SEBRAE, SESI, SENAI, salário-educação e SESC) também são claras ao prever que referidos tributos somente incidirão sobre o montante da REMUNERAÇÃO paga aos empregados, excluindo-se portanto das verbas indenizatórias (vide Lei 2.613/55, Lei 4.863/65,– INCRA; Lei 8.029/90 – SEBRAE; Decreto-Lei 9.043/46 – SESI/SENAI; Decreto Lei 4.048/1942, Decreto Lei 6.246/1944, Decreto Lei 1.422/1975 – Salário Educação; Decreto Lei 9.853/46 – SESC).

Portanto, não há dúvidas que os dispositivos constitucionais que fixam a competência tributária e da legislação de regência das contribuições previdenciárias e de terceiros evidenciam a conclusão que a incidência tributária apenas pode alcançar valores destinados à remuneração salarial dos empregados pelo trabalho.

Ou seja, as verbas pagas ou creditadas ao empregado, para sofrer a incidência dessas contribuições, devem possuir natureza jurídica remuneratória/salarial, excluindo-se, portanto, as verbas de caráter indenizatórias. De acordo com a doutrina como remuneratória podemos entender: “o conjunto de retribuições recebidas habitualmente pelo empregado pela prestação de serviços, seja em dinheiro ou em utilidades, provenientes do empregador ou de terceiros, mas decorrentes do contrato de trabalho, de modo a satisfazer as suas necessidades vitais básicas e de sua família.

Por seu turno, o conceito de salário remete à “totalidade das percepções econômicas dos trabalhadores, qualquer que seja a forma ou meio de pagamento, que retribuam o trabalho efetivo, os períodos de interrupção do contrato e os descansos computáveis na jornada de trabalho”.

Por outro lado, as verbas indenizatórias que compõem a folha têm o intuito de reparar algum dano causado ao trabalhador no desempenho de sua atividade laboral. São elas: décimo terceiro salário sobre aviso prévio, abono pecuniário de férias, férias indenizadas, 1/3 constitucional das férias, aviso prévio indenizado, Auxílio doença e Acidente (primeiros 15 dias) e participação nos lucros e resultados.

A teor do que foi exposto, não temos como confundir verbas remuneratórias de verbas indenizatórias, sendo certo que as primeiras são os valores pagos pelo empregador ao empregado a título de efetiva contraprestação pelos serviços prestados, já as segundas constituem um direito do trabalhador a fim de amenizar uma situação menos vantajosa a ele.

 

FÉRIAS INDENIZADAS

As férias indenizadas, como o próprio nome já diz possui o condão de indenizar o trabalhador pelas férias não gozadas quando da rescisão do contrato de trabalho ou aquelas não gozadas no período oportuno durante a vigência do contrato.

Com efeito, as férias indenizadas não configura contraprestação pelo trabalho do empregado, mas apenas uma forma de garantir ao trabalhador uma indenização por não gozar de suas férias no período oportuno.

Deste modo esta verba não tem cunho salarial e não pode sofrer incidência de contribuição previdenciária, pois não integra o salário -contribuição, conforme prevê o próprio artigo 28, §9º, alínea “d” da Lei 8212/91.

 

DO TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE AS FÉRIAS

De acordo com o disposto no art. 7º, inciso XVII, da CF, o empregado faz jus à percepção de salário adicionado de um terço durante o período de férias, sendo essa uma verba absolutamente desvinculada ao salário, paga apenas no mês em que o empregado recebe suas férias.

Com efeito, o adicional de férias ou o 1/3 constitucional de férias não configura contraprestação pelo trabalho do empregado, mas apenas uma forma de garantir ao trabalhador o gozo de férias sem prejuízo dos compromissos regulares que detém com o seu salário.

A clara intenção do constituinte foi acrescer ao salário uma verba destinada a compensar o desgaste adquirido no período aquisitivo e, ainda, para possibilitar ao empregado a prática de atividades não habituais, como viagens, sem o comprometimento de seu orçamento regular.

Desse modo, o adicional de férias, sejam elas gozadas ou não, proporcionais ou integrais, não possui natureza salarial ou remuneratória, mas indenizatória e não deve haver a incidência de contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional de férias.

 

ABONO PECUNIÁRIO DAS FÉRIAS

O Abono Pecuniário está descrito no artigo 153 da Consolidação das Leis do Trabalho de 1943, e consiste na conversão em dinheiro de 1/3 (um terço) dos dias de férias a que o empregado tem direito. É uma opção dada ao empregado, independentemente da concordância do empregador, desde que requerido no prazo estabelecido na legislação trabalhista.

Evidente, portanto, que o abono de férias reveste-se de caráter indenizatório, pois não remunera o trabalhador pelo contra prestação do trabalho, mas, lhe indeniza por abrir mão de parte de seu direito a férias, não constituindo, portanto, base de cálculo da contribuição previdenciária.

 

AUXÍLIO DOENÇA E ACIDENTE

Quanto às verbas relativas a acidente de trabalho pago até o 15º dia pelo empregador e auxílio doença pago até o 15º dia pelo empregador, previstas no art. 60 da Lei n.º 8.213/91, é evidente a sua natureza indenizatória. Isso porque tais verbas são pagas justamente na hipótese de incapacidade laborativa do empregado. Daí que não se destinam a remunerar o trabalho desenvolvido pelo empregado.

A própria legislação trabalhista e previdenciária estabelece que, no período de gozo de auxílio-doença e auxílio-enfermidade, o empregado é considerado em licença não remunerada (art. 476 da CLT e 63 da Lei n.º 8.213/91).

As verbas relativas a auxílio doença ou acidente pagas até o 15º dia pelo empregador possuem clara natureza indenizatória, pois, como o próprio nome indica, a sua destinação é apenas auxiliar o empregado no cumprimento de suas obrigações.

Nesse sentido, ensina a doutrina especializada que essas parcelas não compõem a remuneração do empregado, exatamente porque não retribuem um trabalho prestado.Ressalte-se que a própria Lei nº 8.212/91 reconhece que os benefícios assistenciais não compõem a remuneração pela retribuição do trabalho prestado.

Dessa forma, para essas duas verbas, já é pacificada a jurisprudência no sentido de não haver incidência de contribuições previdenciárias.

 

PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS

O STJ firmou orientação jurisprudencial no sentido de que as verbas pagas a título de participação nos lucros e resultados não caracterizam salário de contribuição, logo não deve incidir s contribuição previdenciária sobre tal.

 

DO AVISO PRÉVIO INDENIZADO

O aviso prévio indenizado, previsto no art. 487, §1º, da CLT, é a comunicação realizada pelo empregador para o empregado de que pretende realizar a rescisão do contrato de trabalho sem a existência de uma justa causa e sem que o empregado continue exercendo as suas funções, em razão do que lhe será paga uma indenização.

Essa situação comumente ocorre quando o empregador não quer que o empregado continue trabalhando durante o período de aviso prévio, seja por já estar dispensado, seja para não causar problemas no ambiente de trabalho. Com isso, o empregado ficará com o tempo livre para procurar um novo emprego, sendo amparado por indenização equivalente a um salário.

Portanto, o empregado recebe sem prestar nenhum trabalho, o que evidencia não ser esta uma remuneração pelos trabalhos prestados, de modo que sobre esses valores não deve incidir contribuição previdenciária.

 

DO DIREITO À RESTITUIÇÃO E COMPENSAÇÃO DOS VALORES INDEVIDAMENTE RECOLHIDOS NOS ÚLTIMOS 05 (CINCO) ANOS

Demonstrada a inconstitucionalidade e ilegalidade da inclusão das verbas não remuneratórias supramencionadas na base de cálculo das contribuições previdenciárias e de terceiros sobre a folha de salários e demais rendimentos, é indiscutível o direito do empresário à restituição dos valores indevidamente pagos a tais títulos, tal como dispõe o art. 165, inciso I, do CTN.

É importante registrar que o valor a ser ressarcido ao empresário deverá receber correção monetária, a partir da data dos pagamentos indevidos (Súmula n.º 162 do STJ) de acordo com os mesmos índices aplicáveis à atualização desses débitos pela União, no caso, a SELIC.

Além disso, também é preciso observar que a restituição pode se dar também na forma da compensação tributária, ou seja, utilização do crédito decorrente do indébito com débitos vincendos de quaisquer tributos ou contribuições administradas pela Receita Federal do Brasil. Essa é a autorização do art. 74 da Lei n.º 9.430/96.

 

CONCLUSÃO

Se você é empresário e está recolhendo contribuições previdenciárias e de terceiros incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos, apuradas sobre as verbas pagas a título de indenização, descritas acima, é indispensável que procure um advogado de sua confiança para que ele entre com ação na justiça requerendo a concessão de medida liminar para afastar a obrigatoriedade do recolhimento destas verbas, bem como para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária definitiva que obrigue a empresa ao recolhimento das contribuições previdenciárias e de terceiros incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos apuradas sobre as verbas pagas a título de a) abono pecuniário de férias; b) férias indenizadas; c) 1/3 constitucional das férias; d) aviso prévio indenizado; e) Auxílio doença e Acidente (primeiros 15 dias); e f) participação nos lucros e resultados.

Além dos referidos pedidos, a ação também é necessária para assegurar o direito da empresa à repetição dos valores indevidamente recolhidos a tal título no curso dos últimos 5 (cinco) anos anteriores ao ajuizamento, bem como as que vencerem no decorrer da ação, mediante restituição e/ou compensação com débitos vincendos das contribuições previdenciárias e de terceiros e também dos demais tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, com todos os acréscimos legais decorrentes da incidência da Selic retroativa às datas dos respectivos vencimentos e na forma da legislação vigente.

Sem um pedido judicial feito por um advogado e sem o deferimento da liminar por um juiz, além de não conseguir reaver os valores indevidamente pagos, a empresa continuará compelida ao recolhimento das contribuições e, caso não arque com os pagamentos, os supostos débitos poderão ser inscritos em Dívida Ativa, comprometendo a regularidade fiscal da empresa e, ainda, prosseguir para a cobrança judicial.

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